Quando teve conhecimento de que a Hungria iniciara negociações na Itália e na Turquia com os Aliados ocidentais para assinar uma paz separada, Hitler tomou a decisão de ocupar o país até então seu aliado. A 19 de março de 1944, o SS-Obersturmbannführer Adolf Eichmann e o seu Sondereinsatzkommando chegavam a Budapeste para organizar o terrível plano de deportação do último grande grupo de judeus sobreviventes da Europa. O primeiro transporte com destino a Auschwitz-Birkenau partiu a 29 de abril de Kistarcsa, perto de Budapeste, com 1800 homens e mulheres; o segundo saiu a 30 de abril do campo de trabalho de Topolya, na Jugoslávia ocupada pela Hungria, com cerca de duas mil pessoas.
Entre elas, encontrava-se o poeta, jornalista e autor deste livro, József Debreczeni.
No tenebroso «país» de Auschwitz-Birkenau, como o designa o autor, Debreczeni, que tinha cumprido três anos de trabalho forçado em Topolya e contava então com 39 anos, escapou por duas vezes à morte imediata: na «seleção» de que foi alvo à chegada ao campo, ao ser conduzido para a fila da direita – a dos que iriam trabalhar forçadamente até à morte – em vez de para a fila da esquerda – destinada a mulheres, crianças, idosos e doentes, diretamente conduzidos às câmaras de gás (hoje sabe-se que 2698 pessoas foram assassinados à chegada a Birkenau); e, mais tarde, ao «optar» por fazer a pé os dez quilómetros até ao campo de concentração de Auschwitz I, em vez de seguir de camioneta «sugerida» pelos elementos das SS (também com destino às câmaras de gás).
A «escolha» que fez condenava-o à morte lenta, de fome, frio e exaustão pelo trabalho; mas, tal como Primo Levi, József Debreczeni viria a adoecer gravemente e teria a «sorte» de se encontrar, quando as tropas soviéticas o libertaram em maio de 1945, no «Crematório Frio» – «hospital» onde os prisioneiros demasiado debilitados aguardavam a execução – do campo de trabalho de Dörnhau.
Publicada em húngaro em 1950, Crematório Frio – Memória do Território de Auschwitz foi considerada à época por um crítico como «uma das mais duras e impiedosas acusações ao nazismo jamais escritas». Nunca antes traduzida para a língua inglesa, é finalmente editada, volvidos mais de 70 anos, em 15 idiomas – entre os quais o português.
Neste «nosso frágil presente, em que cresce a ameaça de um novo fascismo», este é, nas palavras do vencedor do National Jewish Book Award Daniel Torday, um «documento necessário para nos recordar como é fácil o passado regressar ao presente» e um alerta para as gerações futuras.
Com prefácio de Irene Flunser Pimentel e chancela Temas e Debates, chega às livrarias de todo o país a 21 de março.