«A saúde do mundo faz parte da saúde das nações, mesmo quando esta última não pode ser mantida sem que se garanta a primeira.»
O derrube das barreiras entre os espaços selvagem e doméstico e a sua vertente ominosa. As vias de comunicação que encurtaram o tempo e a distância e a boleia inevitável das infeções. O combate árduo para conseguir fundos e espaço adequado para a investigação e produção de vacinas.
O conflito imemorial entre o «é» e o «devia». Os jogos de poder a curto prazo e segurança a longo prazo. Os hábitos de gratificação imediata e a prosperidade das gerações futuras. O culto do individualismo e as necessidades urgentes do interesse comum.
Sobre tudo isto e muito mais se debruça este sublime trabalho de Simon Schama onde, além da sua, ecoam as vozes de inúmeras figuras conhecidas do passado – como as de Voltaire e Adrien Proust, pai do célebre escritor e reconhecido «geógrafo das epidemias» em Paris; as injustamente desconhecidas, como a de Waldemar Haffkine, magnífico altruísta responsável pela primeira vacina eficaz para os seres humanos contra infeções bacterianas mortais; mas também algumas da nossa era, como as dos líderes populistas Donald Trump ou Jair Bolsonaro, cuja fúria e impotência perante um «inimigo» microbiano recente se traduziriam em estados de negação e jogos de culpas nacionalistas.
«É apenas por meio de experiências subtis, bem planeadas e persistentes que uma pessoa consegue obrigar a natureza a revelar um segredo», disse Pasteur; mas a história da vacinação é também um frio e por vezes inacreditável registo de ciladas políticas e acusações de espionagem até àquele que foi um triunfo da cooperação internacional sobre os egoísmos nacionais, como tão bem nos demonstra Simon Shama em Corpos Estranhos – Pandemias, Vacinas e a Saúde das Nações, soberba investigação que a Temas e Debates faz chegar às livrarias a 8 de fevereiro.